FRAGMENTOS- DEMÓCRITO DE ABDERA 1. PROCLO: Os homens recusam-se a pensar na hora da morte e, quando ela chega, encontra-os despreparados. Surpresos, não conseguem escrever seu testamentos e, segundo as palavras de Demócrito, são forçados a carregar um duplo (fardo). 2. Etimológico de Orion: Tritogênia, Atena, segundo Demócrito, quer dizer sabedoria. Têm origem no saber estas três coisas: deliberar bem, falar sem erros e fazer o que é preciso. Demócrito, porém, ao dar a etimologia da palavra (Tritogênia), diz que da sabedoria nascem: o calcular bem, o falar bem e o fazer o que é preciso. 3. PLUTARCO: E preciso que aquele que quer sentir-se bem não faça muitas coisas nem particular nem publicamente, e que aquilo que faz não assuma além de sua força e natureza. Ao contrário, é preciso que, mesmo que a sorte lhe seja hostil e, pela aparência, o leve pouco a pouco ao excesso, tenha cuidado bastante para renunciar e não procurar mais que suas forças permitem, pois uma plenitude razoável é coisa mais segura que uma superplenitude. 4. CLEMENTE DE ALEXANDRIA: Pois o prazer e o desprazer são o limite (das coisas vantajosas e desvantajosas). 5. DIÓGENES LAÉRCIO: Demócrito, como ele próprio diz na Pequena Ordem do Mundo, era jovem quando Anaxágoras era velho e mais moço quarenta anos. Compôs a Pequena Ordem do Mundo 730 anos após a tomada de Tróia. Favorino diz nas Histórias Variadas que Demócrito afirmou sobre Anaxágoras que não eram deste as opiniões sobre o sol e a lua, mas antigas, tendo-as ele assumido de outros. Ridicularizou sua obra sobre a ordem do universo e da inteligência, mal disposto com Anaxágoras, porque este não lhe dera acolhida. 6. SEXTO EMPÍRICO: No Sobre as Formas, Demócrito diz: E é preciso que o homem aprenda segundo a regra seguinte: Ele está afastado da realidade. 7. IDEM: Por convenção existe o doce e por convenção o amargo, por convenção o quente, por convenção o frio, por convenção a cor; na realidade, porém, átomos e vazio... Nós, porém, realmente nada de preciso apreendemos, mas em mudança, segundo a disposição do corpo e das coisas que nele penetram e chocam. Na realidade não compreendemos como cada coisa é ou não é ficou muitas vezes demonstrado. 8. IDEM: Há duas espécies de conhecimento, um genuíno, outro obscuro. Ao conhecimento obscuro pertencem, no seu conjunto, vista, audição, olfato, paladar e tato. O conhecimento genuíno, porém, está separado daquele. Quando o obscuro não pode ver com maior minúcia, nem ouvir, nem sentir cheiro e sabor, nem perceber pelo tato, mas é preciso procurar mais finamente, então apresenta-se o genuíno, que possui um órgão de conhecimento mais fino. 9. VITRUVIO: Sobre os fenômenos da natureza, Tales de Mileto, Anaxágoras de Clazômena, Pitágoras de Samos, Xenófanes de Colofão, Demócrito de Abdera descobriram as regras segundo as quais eles são governados pela natureza das coisas e o modo pelo qual vêm a existir. Tendo prosseguido as descobertas deles, Eudoxo, Euctemon, Calipo, Meton, Filipe, Hiparco, Arato e outros descobriram o nascimento e ocaso dos astros e o significado das tempestades, a partir da astrologia, com o método dos calendários, e deixaram este mão do explicado aos pósteros. Descrevi, de acordo com Demócrito, as figuras que no mundo dos astros são modeladas e formadas pela natureza e pela mente divina, apenas, porém, aquelas cujo nascente e ocaso podemos notar e contemplar com nossos olhos. 10. Agatêmero: Damastes de Sigéia, tendo copiado a maior parte dos escritos de Hecateu, escreveu um "Périplo". Um após outro, Demócrito, Eudoxo e alguns outros ocuparam-se com viagens em torno da terra e périplos. Os antigos descreveram a terra como redonda, tendo a Grécia no centro e, no centro desta, Delfos, pois em Delfos estava o umbigo da terra. Demócrito, homem de grande experiência, foi o primeiro a ver a terra com a forma de um retângulo cujo comprimento equivale a uma vez e meia a sua largura. O peripatético Dicearco concordou com ele. 11. MÁLIO TEODORO: Crítias afirma que o primeiro a inventar o hexâmetro dactílico foi Orfeu, Demócrito que foi Museu. 12. CÍCERO: Muitas vezes ouvi dizer que não pode existir (afirmação atribuída a Demócrito e Platão) nenhum bom poeta sem entusiasmo da alma e sem um sopro como que de loucura. Pois Demócrito diz que nenhum poeta pode ser grande sem loucura, afirmação idêntica à de Platão. 13. HORÁCIO: Demócrito acreditou que o gênio é mais fecundo que uma arte pobre e excluiu do Helicão os poetas saudáveis... 14. CLEMENTE DE ALEXANDRIA: Um poeta, tudo o que ele escreve com entusiasmo e sopro sagrado é, sem dúvida, belo... 15. DIO CRISÓSTOMO: Demócrito diz sobre Homero o seguinte: Homero, porque recebeu uma natureza divina, construiu uma estrutura ordenada de versos variados, uma vez que não seria possível sem uma natureza divina e demoníaca realizar versos tão sábios e belos. 16. PORFÍRIO: Também Demócrito informava sobre a águia que seus ossos eram negros. 17. Escólios: As palavras: "Oxalá tivesse ele morrido antes!" o arauto diz ou para ser ouvido também pelos gregos para tomá-los benévolos para com os outros troianos, uma vez que também eles estariam irados contra Alexandre ou as fala sozinho consigo mesmo. Assim julga Demócrito que não as considera apropriadas para serem ditas abertamente. 18. PROCLO: (Demócrito afirmava) que os nomes existem por acaso e não por natureza. Chamou a primeira prova polissemia, a segunda, equilíbrio, a terceira, metonímia, e a quarta, anonimia. 19. COLUMELA: Há uma dissensão antiga sobre a localização geográfica mais favorável às vinhas... Demócrito e Magon louvam a região norte porque julgam que as vinhas dessa região se tornam muito produtivas e são superiores pela qualidade do vinho. 20. IDEM: Demócrito, Magon e Vergílio também escreveram que abelhas podem ser geradas de um novilho morto. 21. IDEM: Demócrito, no livro que chamou Sobre a Agricultura, julga que agem com pouca prudência os que cercam suas hortas, porque um muro, construído com tijolos e batido por chuvas e tempestades na maior parte do tempo, não poderá durar anos e, feito de pedras, exigirá gastos superiores ao valor da propriedade, pois precisará de um patrimônio, quem quiser construir muros de grande extensão. 22. APOLÔNIO: Demócrito chamou de circuito a borda que circunda a concha do escudo. 23. APOLÔNIO DÍSCOLO: Demócrito usou as formas contratas dos pronomes nós, vós, eles. 24. CLEMENTE DE ALEXANDRIA: Dos homens sábios poucos estenderam as mãos em direção ao lugar que nós helenos, hoje, chamamos ar e disseram: "Tudo Zeus fala e tudo ele sabe, dá e tira, e é ele o rei de todas as coisas". 25. IDEM: Segundo Demócrito, a medicina cura as doenças do corpo, a sabedoria livra a alma das paixões. 26. IDEM: A união sexual é uma pequena apoplexia, pois o homem sai do homem e dele se arranca apartando-se como que por um golpe. 27. IDEM: A natureza e a instrução são algo semelhante, pois a instrução transforma o homem, mas, transformando-o, cria-lhe a natureza. 28. GALENO: O homem, um microcosmo. 29. DEMÓCRATES: Quem ouvir de mim estas sentenças com inteligência, realizará muitos atos dignos de um homem e não realizará muitos atos vis. 30. IDEM: Quem escolhe os bens da alma, escolhe os divinos; quem escolhe os do corpo, escolhe os humanos. 31. IDEM: É belo opor obstáculos a quem comete injustiça; senão, não de participar da injustiça dele. 32. IDEM: E preciso ou ser bom ou imitar quem o é. 33. IDEM: Não é pelo corpo, nem pela riqueza que os homens são felizes, mas pela retidão e muita sabedoria. 34. IDEM: Não por medo, mas por dever, evitai os erros. 35. IDEM: Coisa grande é, mesmo no infortúnio, pensar naquilo que é preciso. 36. IDEM: Arrependimento de atos vergonhosos é salvação da vida. 37. IDEM: Quem comete injustiça é mais infeliz que o que sofre injustiça. 38. IDEM: É magnanimidade suportar com doçura a falta de tato. 39. IDEM: Ceder à lei, ao chefe e ao mais sábio é pôr-se em seu lugar. 40. IDEM: À censura dos maus o homem bom não dá atenção. 41. IDEM: É duro ser governado por um inferior. 42. IDEM: Quem fosse totalmente submisso ao dinheiro jamais poderia ser justo. 43. IDEM: Para a persuasão a palavra frequentemente é mais forte que o ouro. 44. IDEM: Quem adverte aquele que pensa ser inteligente, trabalha em vão. 45. IDEM: Muitos, sem ter aprendido a razão, vivem segundo a razão. 46. IDEM: Muitos, praticando os atos mais vergonhosos, elaboram os mais excelentes discursos. 47. IDEM: Os tolos, quando infelizes, são sábios. 48. IDEM: Obras e ações de virtude, não palavras, é preciso invejar. 49. IDEM: Reconhecem as coisas belas e as invejam os bem dotados para elas. 50. IDEM: A boa natureza dos animais é a força do corpo; a dos homens, a excelência do caráter. 51. IDEM: As esperanças dos que pensam retamente são viáveis, as dos tolos impossíveis. 52. IDEM: Nem arte, nem sabedoria é algo acessível, se não há aprendizado. 53. IDEM: E melhor acusar as próprias faltas que as alheias. 54. IDEM: Aqueles cujo caráter é bem ordenado vivem na boa ordem. 55. IDEM: O belo não é não cometer injustiça, mas nem mesmo querer fazê-lo. 56. IDEM: Elogiar por atos belos é belo, pois fazê-lo por atos vis é próprio de um falso e enganador. 57. IDEM: Muitos eruditos não têm inteligência. 58. IDEM: É preciso forjar muitos pensamentos, não muitos conhecimentos. 59. IDEM: Deliberar previamente antes de agir é melhor que arrepender-se. 60. IDEM: Não em todos, mas apenas nos dignos de fé, deve-se confiar; uma coisa é própria do simplório, a outra do sábio. 61. IDEM: Um homem é digno de fé ou não o é, não somente pelo que faz, mas também é pelo que quer. 62. IDEM: Para todos, o belo e o verdadeiro são a mesma coisa, mas o agradável é diferente para cada um. 63. IDEM: É próprio da criança, não do homem, desejar desmedidamente. 64. IDEM: Prazeres intempestivos geram aversão. 65. IDEM: Desejar algo violentamente cega a alma para o restante. 66. IDEM: E amor reto desejar sem desmedida as coisas belas. 67. IDEM: É agradável recusar algo que não é útil. 68. IDEM: Para os tolos é melhor ser governado que governar. 69. IDEM: Dos tolos não a palavra, mas o infortúnio é o mestre. 70. IDEM: Fama e riqueza sem inteligência não são aquisição segura. 71. IDEM: Conseguir bens não é sem utilidade, mas, através da injustiça, é o pior de tudo. 72. IDEM: E triste imitar os maus e não querer imitar os bons. 73. IDEM: E vergonhoso ocupar-se muito das coisas alheias e ignorar as próprias. 74. IDEM: O sempre adiar torna sem fim as ações. 75. IDEM: Falsos e bons na aparência os que de boca fazem tudo, mas nada na realidade. 76. IDEM: Causa de erro é a ignorância do melhor. 77. IDEM: E preciso que quem comete atos vergonhosos tenha em primeiro lugar vergonha de si mesmo. 78. IDEM: Quem se contradiz e paira muito, não tem boa disposição para aprender o que é preciso. 79. IDEM: E cupidez falar sobre tudo e não querer ouvir nada. 80. IDEM: E preciso guardar-se do mau, para que ele não aproveite uma ocasião propícia. 81. IDEM: Quem inveja, traz sofrimentos para si mesmo, como se fosse um inimigo. 82. IDEM: Inimigo não é quem comete injustiça, mas o que quer cometê-la. 83. IDEM: O ódio dos parentes é muito mais penoso que o dos estranhos. 84. IDEM: Não sejas desconfiado com todos, mas cuidadoso e seguro. 85. IDEM: Deve-se receber favores com a intenção de corresponder com outros maiores. 86. IDEM: Ao prestar um favor, examina quem o recebe; não venha ele, por ser falso, pagar um bem com o mal. 87. IDEM: Pequenos favores prestados no momento oportuno são os maiores para quem os recebe. 88. IDEM: As honras valem muito para os bem pensantes porque eles percebem que estão sendo honrados. 89. IDEM: Benfeitor não é quem visa à retribuição, mas quem optou pela boa ação. 90. IDEM: Muitos, embora pareçam bons amigos, não são e, embora não pareçam, são. 91. IDEM: A amizade de um só homem inteligente é melhor que a de todos os tolos. 92. IDEM: Não merece viver quem não tem um só amigo. 93. IDEM: Aquele a quem os amigos a toda prova não perduram, tem temperamento difícil. 94. IDEM: Muitos põem em fuga aos amigos, quando passam da abastança à pobreza. 95. IDEM: Em tudo é belo o equilíbrio, mas não, parece-me, o excesso e a carência. 96. IDEM: Parece-me que nem por uma só pessoa é amado quem não ama ninguém. 97. IDEM: Velho agradável é aquele que é insinuante e sério no falar. 98. IDEM: A beleza do corpo é beleza animal, se sob ela não está a inteligência. 99. IDEM: Na fortuna, encontrar um amigo é fácil, mas, no infortúnio, é a coisa mais difícil. 100. IDEM: Amigos não são todos os parentes, mas os que estão de acordo sobre o vantajoso. 101. IDEM: É coisa digna, sendo homem, não rir dos infortúnios dos homens, mas chorá-los. 102. IDEM: A custo os bens vêm ao encontro dos que os procuram, mas os males vêm ao encontro também dos que não os procuram. 103. IDEM: Os que gostam de censurar não têm disposição natural para a amizade. 104. IDEM Não se exercite a mulher na palavra; pois isso é coisa perigosa. 105. IDEM Ser governado por uma mulher é, para o homem, a extrema violência. 106. IDEM: E próprio de inteligência divina sempre discutir algo belo. 107. IDEM: Causam grandes prejuízos os que louvam os tolos. 108. IDEM: É melhor ser elogiado por um que por si mesmo. 109. IDEM: Se não entendes os louvores, pensa que estás sendo adulado. 110. DIÓGENES LAÉRCIO: Vim para Atenas e ninguém tomou conhecimento de mim. 111. IDEM: Na realidade nada sabemos, pois a verdade jaz num abismo. 112. DIONÍSIO: Demócrito dizia que preferia descobrir uma etiologia a possuir o reino dos persas. 113. IDEM: Os homens plasmaram uma imagem da sorte como desculpa para sua falta de julgamento; pois raramente a sorte conflita com a inteligência e, no mais das vezes, na vida o olhar penetrante e inteligente mostra o caminho reto. 114. EROTIANO: Demócrito chama a pulsação venosa o movimento das artérias. 115. GALENO: Pois se nem é capaz de começar sem a evidência, como poderia ser digno de fé fundamentado-se naquela que lhe fornece os princípios? Ciente disso, também Demócrito, quando ataca as aparências dizendo: Por convenção há cor, por convenção há o doce, por convenção há o amargo, mas na realidade os átomos e o vazio, imagina os sentidos respondendo à inteligência: Pobre inteligência, em nós encontras as provas e nos derrubas! Para ti derrubar-nos é cair. 116. FILODEMO: Demócrito diz que a música é (a arte) mais recente, justifica sua afirmação dizendo que não a criou a necessidade, mas veio a existir a partir do supérfluo. 117. PLUTARCO: Pois a palavra é sombra da ação. 118. IDEM: (Pela temperança manifesta-se) o espírito que se alimenta interiormente está enraizado nele próprio e segundo Demócrito, ele próprio acostumado a tirar de si mesmo o prazer. 119. IDEM: O umbigo é firmado primeiro no útero como ancoragem contra a agitação e o deslocamento, cabo e pedúnculo do fruto que está sendo gerado e virá a existir. 120. IDEM: São mais graves as doenças da alma ou as do corpo? Se tu te abrisses, segundo Demócrito, encontrarias dentro de ti um celeiro de males diversos, causadores de muito sofrimento, e um tesouro. 121. IDEM: Se as pesquisas fáceis movem as almas de modo conveniente, deve-se deixar de lado, segundo Demócrito, as palavras de quereladores e enroladores de corda. 122. IDEM: Pois num peixe de que muitos partilham não há espinhos, como diz Demócrito. 123. IDEM: Não há luz enviada por Zeus que não encerre a pura luz do éter. 124. IDEM: O homem político não desprezará a verdadeira honra e a gratidão baseada na benevolência e disposição dos que são lembrados, nem desprezará a fama evitando agradar ao próximo. 125. IDEM: Talvez sejamos ridículos quando nos vangloriamos de ensinar os animais. Deles, prova-o Demócrito, somos discípulos nas coisas mais importantes: da aranha no tecer e remendar, da andorinha no construir casas, das aves canoras, cisne e rouxinol no cantar, por meio da imitação. 126. IDEM: Ora, vê ainda como, com recursos das ciências físicas e com sucesso fez frente a Demócrito deixando-o sem saída: Se um cone fosse cortado junto à base por um plano, o que se deveria pensar sobre a superfície das partes cortadas? Seriam iguais ou desiguais? Sendo desiguais, farão irregular o cone, pois nele haveria muitas incisões em forma de degraus e muitas asperezas. Sendo iguais, as partes cortadas serão iguais e o cone terá a aparência de um cilindro, porque constituído de círculos iguais e não desiguais, coisa que é absurdo muito grande. 127. ARISTÓTELES: Para Demócrito, também a esfera corta porque de certo modo é um ângulo. 128. PLUTARCO: Colotes diz contra Demócrito que ele, afirmando que cada uma das coisas não é mais assim do que assim, confunde a vida. Mas Demócrito está tão longe de pensar que cada uma das coisas não é mais assim do que assim que lutou contra Protágoras, autor de tal afirmação; e contra ele escreveu obras numerosas e convincentes. Não tendo conhecimento dessas obras nem em sonho, Colotes errou sobre o enunciado do homem (isto é, de Demócrito) no qual há uma definição: o "ada" não existe mais que o "nada", chamando de "ada" o corpo e de "nada" o vazio, já que este também possui uma certa natureza e substância própria. 129. IDEM: Que me critiquem sobre isso os que viveram como administradores e cidadãos. São eles que Colotes injuriou. Demócrito exorta-nos a ensinar a arte política desses homens, por ser a maior, e a procurar sofrimentos de onde nascem para os homens bens maiores e mais brilhantes. 130. IDEM: Ao nascer, o sol impulsionou com sua luz as ações e os pensamentos de todos, como diz Demócrito, homens que dia a dia pensam coisas novas, com impulso mútuo estimulam-se uns aos outros para as ações, como os que estão sobrecarregados com pesada carga. 131. IDEM: É natural que o corpo tenha esta antiga acusação contra a alma a respeito das paixões. E Demócrito, imputando à alma a causa da infelicidade, diz: Se o corpo instaurasse um processo contra ela pelas dores que padeceu e pelos maltratos que sofreu e se fosse eu o juiz da acusação, com prazer condenaria a alma, alegando que, de um lado, ela fez perecer o corpo por suas negligências e o exauriu com a embriaguez e, de outro, o destruiu e dilacerou com o amor do prazer, como se, estando um instrumento ou utensílio em mau estado, eu acusasse quem o emprega sem cuidado. 132. PORFÍRIO: Pois viver mal, não refletida, sábia e piedosamente, dizia Demócrito, não é viver mal, mas ir morrendo durante muito tempo. 133. Escólios: Antigamente julgavam que as feiticeiras faziam descer o sol e a lua. Por isso até mesmo à época de Demócrito muitos chamavam de declínio aos eclipses. 134. IDEM: Pois os animais, diz Demócrito, se arrebanham com os animais da mesma espécie; pombas com pombas, grous com grous, e, entre os outros irracionais, acontece o mesmo. Assim também entre os inanimados, como se pode ver entre sementes peneiradas e areias das praias: lá, com o turbilhão da peneirada há uma separação e lentilhas se ajuntam a lentilhas, grãos de cevada aos de cevada, os de trigo aos de trigo; cá, de acordo com o movimento das ondas, areias oblongas são impelidas para junto de oblongas, redondas para junto de redondas, como se a semelhança entre as coisas tivesse força para reuni-las. 135. IDEM: Demócrito diz que certas imagens se aproximam dos homens e que, destas, umas são benfazejas e outras malfazejas. Por isso desejava encontrar imagens favoráveis. 136. SIMPLÍCIO: Um turbilhão de todas as espécies de formas (= átomos) se separou do todo. 137. IDEM: A estas coisas (i. e., os átomos) eles (i. e., os discípulos de Demócrito) chamavam natureza, pois diziam que elas estão aspergidas em todas as direções. 138. ESTOBEU: Não desejes saber tudo, para que não te tornes desconhecedor de tudo. 139. IDEM: A felicidade é a alma e a infelicidade também. 140. IDEM: A felicidade não mora em rebanhos nem em ouro; a alma é a moradia da divindade. 141. IDEM: Das mesmas coisas de onde nascem para nós os bens poderíamos também tirar os males, mas por elas poderíamos também escapar aos males. Por exemplo, água funda é útil para muitas coisas e, por outro lado, má, pois há o perigo de afogar-nos. Inventou-se, portanto, um recurso: ensinar a nadar. 142. IDEM: Para os homens os males nascem dos bens, caso não se saiba dirigir os bens com correção. Portanto, não é justo contar tais coisas entre as más, mas entre as boas; para os homens é possível usar os bens também como ajuda contra os males, se se quiser. 143. IDEM: Quem de boa vontade se lança a obras justas e lícitas, dia e noite está alegre, seguro e despreocupado; mas, quem não faz conta da justiça e não realiza o que é preciso, entedia-se com coisas tais, quando se lembra de alguma delas, sente medo e atormenta-se a si mesmo. 144. IDEM: Os deuses dão aos homens todos os bens, tanto antigamente quanto agora. Apenas as coisas quantas são más, prejudiciais e inúteis, os deuses não dão aos homens nem antigamente, nem agora, mas são eles próprios que as procuram por cegueira da mente e insensatez. 145. IDEM: A sorte é generosa, mas insegura; a natureza, porém, autossuficiente; por isso vence com o que tem de menor e seguro o que a esperança tem de maior. 146. IDEM: Um discurso nobre não encobre uma ação má, nem uma ação boa é enxovalhada por uma calúnia. 147. IDEM: O pior de todos os males é a leviandade no educar a juventude, pois é ela que gera aqueles prazeres de que nasce a perversidade. 148. IDEM: Se as crianças tivessem liberdade de não trabalhar, nem as letras aprenderiam, nem a música, nem as lutas, nem o sentimento de honra que é a principal condição para a virtude, pois é sobretudo desses estudos que costuma nascer o sentimento de honra. 149. IDEM: A educação para afortunados é adorno, mas para infortunados é lugar de refúgio. 150. IDEM: Mais eficiente para levar à virtude mostrar-se-á quem emprega exortação e persuasão pela palavra do que quem usa lei e coação. E provável, com efeito, que às ocultas erre quem a lei afasta da injustiça; aquele, porém, que é conduzido ao dever pela persuasão, não é provável que, às ocultas ou às claras, cometa uma falta. E agindo corretamente com perspicácia e saber que se vem a ser corajoso e, ao mesmo tempo, franco. 151. IDEM: Os belos objetos o aprendizado constrói com o esforço, mas os feitos se oferecem de si mesmo sem esforço. 152. IDEM: Há perspicácia entre jovens e ausência de perspicácia entre velhos, pois o tempo não ensina a pensar, mas a instrução precoce e a natureza. 153. IDEM: O convívio contínuo dos maus faz crescer a disposição para o vício. 154. IDEM: Alguns homens, não conhecendo a dissolução da natureza mortal, mas conhecendo os sofrimentos que ocorrem na vida, penam durante o período de vida em meio de perturbações e temores, inventando histórias falsas sobre o tempo após o fim. 155. IDEM: São melhores as esperanças dos homens educados que a riqueza dos ignorantes. 156. IDEM: Acordo no pensar engendra amizade. 157. IDEM: Para os homens é mais acertado dar valor à alma que ao corpo, pois, se a perfeição da alma corrige a maldade do corpo, a força do corpo, sem inteligência, em nada faz melhor a alma. 158. IDEM: Limite das coisas vantajosas e desvantajosas é o prazer e o desprazer. 159. IDEM: O melhor para o homem é levar a vida com o máximo de ânimo e o mínimo de desânimo. Isso aconteceria, se não se baseassem os prazeres nas coisas mortais. 160. IDEM: De obras vis deve-se afastar também as palavras. 161. IDEM: Para os homens o bom ânimo vem a existir com a moderação de alegria e comedimento de vida. As coisas que faltam e as que sobram costumam sofrer mudanças e produzir na alma grandes comoções. As almas que oscilam entre pontos extremos nem são estáveis, nem animosas. Deves, portanto, voltar o pensamento ao que é possível e satisfazer-te com o que está à mão, lembrando pouco dos que são invejados e admirados e sem ficar pensando neles, continuamente. Deves, porém, olhar para a vida dos que pensam, refletindo sobre o que os faz sofrer muito, para que aquilo que tens à mão e aquilo que possuis te pareçam grandes e invejáveis e não mais sobrevenham, por desejares mais do que tens, sofrimentos para tua alma. Quem admira os que possuem e são chamados felizes pelos outros homens e os têm presentes a toda hora em seu pensamento, sempre é forçado a empreender uma nova tarefa e a lançar-se, por desejo de algo, na realização de uma ação irremediável que as leis proíbem. Por isso, é preciso não ficar pensando muito naquelas coisas, mas, com base nestas, ter ânimo comparando a própria vida com a dos que vivem pior e dar-se por feliz pensando no que eles sofrem e no quanto é melhor a tua condição e a tua vida. Tendo isso em mente, viverás com melhor ânimo e afastarás durante a vida não poucas maldições: malevolência, inveja e animosidade. 162. IDEM: E mais fácil elogiar e censurar o que não é preciso, mas fazer uma e outra coisa é próprio de caráter mau. 163. IDEM: É mostra de sabedoria guardar-se da injustiça iminente, mas de insensibilidade não vingar-se da sofrida. 164. IDEM: Os grandes prazeres nascem do contemplar as belas obras. 165. IDEM: Imagens belas de se ver pelas vestes e adornos, mas vazias de coração. 166. IDEM: O esquecimento dos próprios males engendra a coragem. 167. IDEM: Os insensatos são moldados pelos dons da sorte, os que têm entendimento para tais coisas, pelos da sabedoria. 168. IDEM: O animal, quando precisa de algo, sabe de quanto precisa, mas o homem, quando precisa, não tem consciência disso. 169. IDEM: Insensatos, odiando a vida, por temer o Hades querem viver. 170. IDEM: Insensatos vivem sem tirar prazer da vida. 171. IDEM: Insensatos desejam longevidade sem tirar prazer da longevidade. 172. IDEM: Insensatos desejam as coisas ausentes, mas desperdiçam as presentes ainda que mais valiosas que as passadas. 173. IDEM: Os homens, ao fugir da morte, perseguem-na. 174. IDEM: Insensatos a ninguém agradam durante a vida inteira. 175. IDEM: Insensatos desejam a vida temendo a morte. 176. IDEM: Insensatos, temendo a morte, querem envelhecer. 177. IDEM: Não todo prazer, mas o que está no belo é preciso escolher. 178. IDEM: O comedimento do pai é a melhor proclamação para os filhos. 179. IDEM: Para os autossuficientes na alimentação nunca há noite curta. 180. IDEM: A sorte proporciona mesa suntuosa, mas mesa suficiente, o comedimento. 181. IDEM: O comedimento multiplica as alegrias e faz maior o prazer. 182. IDEM: Sonos diurnos significam perturbação do corpo ou inquietude ou preguiça ou falta de instrução. 183. IDEM: A coragem faz pequenos os golpes do destino. 184. IDEM: Corajoso não é apenas quem supera os inimigos, mas quem supera também os prazeres. Alguns são senhores nas cidades, mas são escravos de mulheres. 185. IDEM: Fama de justiça é coragem e intrepidez de julgamento, mas o temor do infortúnio é limite da injustiça. 186. IDEM: A sabedoria intrépida é digna de todas as coisas. 187. IDEM: Só são amados dos deuses aqueles a quem é odioso cometer injustiça. 188. IDEM: Riqueza que nasce de ato mau possui muito nítida uma mácula. 189. IDEM: O desejo de riquezas, que não é delimitado pela saciedade, é muito mais penoso que a miséria extrema, pois os desejos maiores fazem maiores as carências. 190. IDEM: Maus lucros trazem perda de virtude. 191. IDEM: Esperança de lucro mau é começo de perda. 192. IDEM: O acúmulo excessivo de riqueza para os filhos é disfarce de avareza que nisso denuncia o seu modo próprio de ser. 193. IDEM: As coisas de que o corpo precisa estão à disposição de todos facilmente, sem pena e sofrimento; tudo quanto precisa de pena e sofrimento e torna dolorosa a vida não é o corpo que deseja, mas a má constituição do pensamento. 194. IDEM: O desejo de ter mais destrói o que está à mão, como para o cão de Esopo. 195. IDEM: É preciso falar a verdade; não falar muito. 196. IDEM: Sinal próprio da liberdade é a linguagem aberta, mas perigo é a avaliação do momento oportuno. 197. IDEM: Os avaros têm o destino da abelha: trabalham como se fossem viver sempre. 198. IDEM: Os filhos dos avaros, quando crescem na ignorância, são como os dançarinos que saltam sobre punhais. Se eles, ao pular, não atingem o único ponto em que devem colocar os pés, morrem. E difícil, porém, atingir esse lugar único, só havendo espaço para os pés. Assim também para aqueles: Se perdem de vista o modelo do pai zeloso e avaro, costumam perder-se. 199. IDEM: Avareza e fome são benéficas e, no momento certo, também os gastos. Mas reconhecer isso é próprio do homem bom. 200. IDEM: A vida sem festas é um longo caminho sem hospedaria. 201. IDEM: Sensato é quem não sofre pelo que não tem, mas se alegra pelo que tem. 202. IDEM: Dentre os prazeres, mais raros são os que mais causam alegria. 203. IDEM: Se alguém ultrapassasse a medida, as coisas mais agradáveis tornar-se-iam as menos agradáveis. 204. IDEM: Os homens em suas preces pedem saúde aos deuses e não sabem que possuem em si mesmos o poder sobre ela. Pela intemperança, fazem o que é adverso e, pelas paixões, são traidores da saúde. 205. IDEM: A todos quantos consideram prazeres os que vêm do estômago, ultrapassando a medida certa na comida, na bebida ou nos amores, os prazeres são curtos e momentâneos (isto é, duram o tempo) em que comem e bebem, mas as dores são numerosas. O desejo por essas mesmas coisas continua presente e, quando têm aquilo que desejam, rapidamente o prazer se vai, nada de útil resta, senão o curto gozo e, outra vez, precisam das mesmas coisas. 206. IDEM: E duro lutar contra o desejo, mas vencê-lo é próprio do homem de bom senso. 207. IDEM: Toda belicosidade é insensata, pois, ao ter em vista o prejudicial para o inimigo, não vê a vantagem própria. 208. IDEM: Termina com má fama quem quer medir-se com o mais forte. 209. IDEM: Os juramentos que fizeram em situação de necessidade os maus não mantêm, se dela escapam. 210. IDEM: Os trabalhos aceitos de bom grado fazem mais leve a carga dos impostos a contragosto. 211. IDEM: O trabalho continuado torna-se mais leve com o hábito. 212. IDEM: Mais numerosos são os que vêm a ser bons pelo exercício do que pela natureza. 213. IDEM: Todos os trabalhos são mais agradáveis que o descanso, quando se atinge o fim pelo qual se trabalha ou se sabe que será alcançado. Por ocasião de cada insucesso, porém, o trabalhar faz sofrer e penar. 214. IDEM: Nada de vil, mesmo que esteja sozinho, fales ou faças. Aprende a respeitar mais a ti que aos outros. 215. IDEM: As leis impediriam que cada um vivesse de acordo com seu próprio gosto, se cada um não prejudicasse o outro; pois a inveja é o início da luta. 216. IDEM: A vida no estrangeiro ensina a autossuficiência: o pão de centeio e a cama de palha são o remédio mais doce para a fome e o descanso. 217. IDEM: Para o homem sábio toda a terra é acessível, pois o mundo inteiro é pátria da alma boa. 218. IDEM: A lei quer beneficiar a vida dos homens, mas ela pode fazê-lo quando eles querem receber o benefício, pois indica para os que o querem a virtude que lhes é própria. 219. IDEM: A guerra civil é um mal para ambas as partes, pois, para vencedor e vencidos, a destruição é igual. 220. IDEM: Pela concórdia torna-se possível realizar grandes obras e, para as cidades, as guerras; de outra maneira, não. 221. IDEM: Na democracia a pobreza tanto mais é preferível à chamada felicidade entre os autocratas quanto a liberdade à escravidão. 222. IDEM: E preciso julgar de maior importância que tudo o mais os interesses da cidade, para que sejam bem dirigidos sem armar contendas contrárias ao direito e sem assumir para si um poder contrário ao bem comum. Uma cidade bem dirigida é o maior apoio e tudo nela está contido: salva a cidade, tudo está salvo; destruída a cidade, tudo está destruído. 223. IDEM: Aos homens probos não é vantagem, descuidando-se das tarefas deles, realizar outras, pois as próprias ficariam mal. Mas, se alguém descuida dos bens públicos, passa a ter má reputação, ainda que não roube nem, em nada, atente contra o direito. Entretanto, também (não) descuidando e (não) cometendo injustiça, corre risco de criar má reputação e até vir a sofrer algo. E inevitável errar, mas não é fácil aos homens perdoar. 224. IDEM: Os maus, quando procuram os cargos oficiais, quanto mais são indignos de procurá-los, tanto mais são despreocupados e estão cheios de insensatez e segurança. 225. IDEM: Quando os poderosos ousam adiantar dinheiro aos que nada possuem, defendê-los e prestar-lhes favores, aí já está incluída a compaixão: os homens não estarão sozinhos e tornar-se-ão amigos, ajudar-se-ão mutuamente, haverá concórdia entre os cidadãos e haverá outros bens quantos ninguém poderia enumerar. 226. IDEM: Justiça é fazer o que é preciso; injustiça, não fazer o que é preciso, mas deixá-lo de lado. 227. IDEM: Entre alguns seres vivos, eis como fica a questão: "Quem matarás ou não matarás?" - Quem mata o que comete injustiça ou quer cometê-la fica impune e, para o bem-estar, antes fazê-lo que não fazê-lo. 228. IDEM: É preciso a todo custo matar todos os seres vivos que, transgredindo a justiça, fazem mal a outrem. Quem o fizer terá maior quinhão de ânimo, de justiça e de posses em toda sociedade organizada. 229. IDEM: Como sobre raposas e serpentes inimigas ficou escrito, também entre os homens parece-me que é preciso fazer: Segundo as leis de nossos pais, matar o inimigo público em toda a sociedade organizada na qual a lei não o proíbe. Proíbem-no, em cada sociedade organizada, as divindades locais, os tratados e os juramentos. 230. IDEM: Quem matasse um ladrão ou pirata ficaria impune ainda que o fizesse com as próprias mãos, ou através de outros ou por um voto. 231. IDEM: Aos que sofrem injustiça é preciso, dentro do possível, vingar e nisso não ser omisso. Agir assim é justo e bom, mas não fazê-lo é injusto e mau. 232. IDEM: E aos que praticam atos dignos de exílio, ou de prisão ou de punição, deve-se condenar a não absolver. Quem os absolve, dando a sentença por visar lucro ou prazer, comete injustiça e, necessariamente, guardará isso dentro de si. 233. IDEM: Participa de maior quinhão de justiça e virtude quem decide as honras maiores (aos mais dignos). 234. IDEM: Em nada respeitar mais os homens que a si mesmo, nem fazer algo mau, quer ninguém vá ver, quer todos os homens. Ao contrário, respeitar principalmente a si mesmo e estabelecer para sua alma esta lei: nada fazer de inadequado. 235. IDEM: Os homens lembram-se mais dos erros do que dos acertos, pois assim é justo. Como não é preciso louvar quem devolve os depósitos que lhe foram confiados, mas é preciso que quem não devolve tenha má fama e sofra punição, assim também o governante. Não foi escolhido, com efeito, para agir mal, mas para agir bem. 236. IDEM: Nenhum recurso tem a constituição, agora em vigor, para impedir que os governantes cometam injustiça, mesmo quando eles são muito bons. E de esperar-se, com efeito, que em situações diferentes ele venha a ser o mesmo, não outro, mas ele próprio. É preciso, de alguma forma, também isto ficar disposto assim: Quem não cometer injustiça alguma, ainda que examine a fundo os atos dos que cometem injustiça, não virá a ficar sob aqueles, mas uma lei ou outra coisa qualquer defenderá quem pratica atos justos. 237. IDEM: Por natureza o governar pertence ao mais forte. 238. IDEM: O temor produz lisonja, mas não obtém benevolência. 239. IDEM: A ousadia é início da ação, mas a sorte é a senhora do fim. 240. IDEM: Dos servidores da casa deves usar como partes do corpo, isto é, de um em vista de outro. 241. IDEM: Uma censura de amante a amada a elimina. 242. IDEM: Quem teve sorte com o genro, encontrou um filho; quem não a teve, perdeu também uma filha. 243. IDEM: Uma mulher é muito mais fina que um homem para maus pensamentos. 244. IDEM: Falar pouco é adorno para a mulher, mas é belo também a parcimônia de adorno. 245. IDEM: A educação dos filhos é coisa escorregadia: o sucesso que tem é cheio de luta e preocupação, e ao insucesso nenhuma outra dor supera. 246. IDEM: Não me parece preciso ter filhos, pois vejo no ter filhos muitos e grandes perigos e muitos sofrimentos, mas colheita pouca e, mesmo essa, magra e pobre. 247. IDEM: Para quem for uma necessidade gerar um filho, será melhor, parece-me, criar um dos de seus amigos. Este filho será tal qual ele deseja, pois é-lhe possível escolher tal como quer. E o que lhe parecer adequado também o acompanhará por inclinação natural. E há nisso uma diferença, na medida em que é possível escolher dentre muitos o filho de seu coração, como se deve. Se alguém gera um filho de sua própria carne, os riscos são muitos, pois será forçoso conviver com o filho que engendrar. 248. IDEM: Aos homens o ter filhos parece estar entre as necessidade que derivam da natureza ou de um preceito antigo. Isto é evidente quanto aos outros seres vivos. Todos eles têm filhotes obedecendo à natureza, sem por certo visar a vantagem alguma. Mas quando os filhotes nascem, labutam e alimentam-nos como podem, zelam muito por eles enquanto são pequenos e, se lhes acontece algo, ficam tristes. Tal é a natureza de todos os seres quantos têm alma. Entre os homens, porém, já se criou a expectativa de que dos filhos advirá também um proveito. 249. IDEM: Aos filhos, tanto quanto é possível, é preciso distribuir o dinheiro e, ao mesmo tempo, zelar por eles para que, tendo-o nas mãos, não cometam um desatino. E nesse mesmo momento que eles vêm a ser mais parcimoniosos com o dinheiro, mais cobiçosos de ganho, e lutam uns com os outros, pois o que se gasta em comum não incomoda como a despesa particular, nem as novas aquisições animam, mas muito menos. 250. IDEM: E possível, sem gastar muito do que é seu, educar os filhos e construir à volta de sua propriedade e das pessoas deles uma muralha protetora. 251. IDEM: O uso do dinheiro, feito com inteligência, pode contribuir para a generosidade e para o bem do povo; sem inteligência, é um imposto pago continuamente. 252. IDEM: Pobreza e riqueza são nomes para carência e saciedade. Não é, portanto, rico o carente, nem pobre o não carente. 253. IDEM: Se não cobiçares muitas coisas, as poucas julgarás muitas, pois o pequeno apetite faz a pobreza equivalente à riqueza. 254. IDEM: E preciso reconhecer que a vida humana é frágil, pouco duradoura e misturada com muitos cuidados e dificuldades, para que haja preocupação por uma posse moderada e a labuta se meça pelas necessidades de cada um. 255. IDEM: Afortunado quem deseja com medida, infortunado quem sofre pelo muito que tem. 256. IDEM: A falta de recursos da comunidade é mais dura do que a de cada um, pois não lhe resta a esperança de ajuda. 257. IDEM: Há doença do lar e da vida como há a do corpo. 258. IDEM: E falta de razão não aceder às necessidades próprias da vida. 259. IDEM: A dor incontrolada de uma alma entorpecida afasta-a com o raciocínio. 260. IDEM: Suportar com brandura a pobreza é próprio do homem sensato. 261. IDEM: Irracionais são as esperanças dos tolos. 262. IDEM: Aqueles a quem dão prazer os sofrimentos do próximo não compreendem que as vicissitudes da sorte são comuns a todos e lhes falta uma alegria que seja sua. 263. IDEM: Força e beleza são bens da juventude, comedimento, a flor da velhice. 264. IDEM: O velho foi jovem, mas, quanto ao jovem, é incerto se ele chegará à velhice. Portanto, o bem realizado vale mais que o que está ainda por vir e é incerto. 265. IDEM: Velhice é mutilação total: tudo tem e de tudo é carente. 266. IDEM: Alguns homens, não conhecendo a dissolução da natureza mortal, mas conhecendo os sofrimentos que ocorrem na vida, penam durante o período de vida em meio de perturbações e temores, inventando histórias falsas sobre o tempo após o fim.